segunda-feira, 20 de julho de 2009

Bad Dreams

Um pequeno poema de um dos grandes mestres sufis.

One day you will look back and laugh at yourself.
You’ll say, “ I can’t believe I was so asleep!
How did I ever forget the truth?
How ridiculous to believe that sadness and sickness
Are anything other than bad dreams.”

Rumi.


Já os sábios antigos focavam o facto de que somente a Luz existia e que as sombras não tinham uma existência real, pois onde a luz chegava não havia trevas. Do mesmo modo a Verdade tem uma existência real e somente quando nós não conseguimos vislumbrar a sua luz é que mergulhamos na tristeza e na doença. A nossa alma perde-se na escuridão da nossa personalidade e é necessário, muitas vezes, que alguém leve uma tocha para iluminar o caminho que nos traga de volta para a Verdade.

Essa tocha são os ideais que elevam a consciência do Homem e o fazem lutar pela Justiça, pelo Amor, pelo Belo e pelo Bom. Esses ideais devem estar presentes na Humanidade, pois quando eles desaparecem todo o mundo mergulha num imenso caos moral, abrindo as portas para uma Idade Média. No entanto, tudo isto são sombra, pois a verdadeira realidade encontra-se escondida no coração de cada ser humano. Cultivemos então esses ideais, para que todos possamos ser como tochas que iluminam o caminho daqueles que ainda se encontram mergulhados nas sombras dos seus próprios egoísmos, ódios e ignorância. Que um dia toda a Humanidade possa olhar para trás e rir de si própria, pensando em como se deixou enganar por maus sonhos, pensando que estes eram reais.

domingo, 22 de fevereiro de 2009

Ousar-Querer-Poder

Estas três palavras fazem parte de uma antiga fórmula hermética. Mas o que ela queria expressar com isso? Acima de tudo mostrar o reflexo no Microcosmos (Homem) dos três aspectos daquilo que Platão chamou o Logos e que nós denominamos Deus, cujo Poder é trino mas a essência é Una.
Os três aspectos são:
I.
Vontade / Lei
II.
Amor - Sabedoria / Energia - Vida
III.
Inteligência / Forma

A isto correspondia, então, a fómula Ousar-Querer-Poder, que procurava indicar ao Homem como é que poderia encarar a vida. A primeira coisa a fazer seria Ousar, que nos remete para o desenvolvimento de uma Vontade semelhante à do Deus que rege o Universo. Explica-nos o Prof. Jorge Angel Livraga que «esta [a Vontade] desenvolve-se por uma contínua atitude de coragem perante a vida; uma vocação decidida pelo risco e pelas aventuras exteriores e interiores». Trata-se, com efeito, de enfrentar os nossos limites, confrontar os nossos medos e inseguranças, de ultrapassar os nosso obstáculos. É conseguir sentir a eterna juventude e uma força interior imparável e saber vivê-las no quotidiano.

A segunda coisa é Querer, «mas querer de uma maneira tão intensa e superior que qualquer paixão humana, por sublimada que seja, não é mais do que uma sombra disforme desse Arquétipo» (Jorge Angel Livraga, O Sentido Oculto da Vida, Ed. Nova Acrópole). É um querer que vem do coração e que se mostra insaciável e que ultrapassa a razão. Isso manifesta-se no Amor por todos os Seres e todas as coisas, pois este sentimento permite-nos a aproximação ao mistério que habita em tudo no Universo, fazendo com que ultrapassemos a parte externa e conheçamos a essência.

A terceira coisa é Poder, e voltamos às sábias palavras do Prof. Livraga: «...poder, acima de tudo, pôr em prática e sob absoluto controlo, os dois primeiros elementos citados, pois os Terceiro Logos [Inteligência-Forma] nasce da união harmónica do Primeiro e do Segundo. Mais claramente: sem Primeiro e sem Segundo, não há Terceiro». Ou seja, o poder é a parte final de um processo de aperfeiçoamento interior. É a capacidade de poder realizar as coisas que se pretende, mas de uma maneira equilibrada e continuada.
Este ensinamento é algo que atravessou os tempos e que se manifestou sob várias formas. Não só na Sabedoria Hermética ou na Filosofia, mas também na Poesia. Não acreditam? Façam a relação de Ousar-Querer-Poder com «Deus quer, o Homem sonha e a obra nasce», de Fernando Pessoa. Boas reflexões.

domingo, 1 de fevereiro de 2009

Filosofia de Vida no Boxe


Estive no outro dia a assistir a um documentário intitulado «When we were kings» e que fala sobre o denominado «combate do século», que ocorreu em Kinshaza, no Zaire, em Outubro de 1974. Esse confronto punha frente a frente dois dos maiores pugilistas de todos os tempos: o gigante e poderoso George Foreman, e o apelidado «Louco de Louisville», Muhammad Ali (na minha opinião o melhor de todos os tempos.
Desde que abracei o caminho da Filosofia habituei-me a ver as coisas sempre de um ponto de vista filosófico, e o mesmo aconteceu com este documentário. Vê-lo fez-me pensar na estratégia que se pode utilizar na vida, para mim aquele combate simbolizou o combate que nós, como seres humanos, temos que efectuar no quotidiano.


Os Pugilistas

Primeiro há que contextualizar. Este combate foi considerado um dos maiores de sempre devido à presença de dois pugilistas de grande nomeada. Falar de Muhammad Ali é falar do Sr. Boxe, pois ele foi o grande expoente da modalidade nos anos sessenta e setenta. A sua rapidez e agilidade eram invulgares nos pesos pesados e a sua maneira de combater pouco ortodoxa, já que combatia com os braços em baixo, em vez de colocar as luvas em cima, para protecer a cara. Ele já tinha sido campeão do mundo, mas tinha sido despojado do título devido a ter-se recusado a participar na guerra do Vietname. Depois de quase três anos sem combater ele voltou ao ringue e após dois combates iria tentar o assalto ao título defrontando o compacto e ainda invicto Joe Frazier. Ali perdeu.
Entretanto entrava em cenário o oponente de Ali, George Foreman. Com um físico impressionante e uma força arrasadora, «Big George» causou uma das grandes surpresas da história do boxe quando derrotou o campeão em título, Joe Frazier em dois assaltos, levando-o ao tapete por 6 vezes!! Cerca de um ano depois ele defrontou Ken Norton, que tal como Frazier, tinha derrotado Ali, e despachou-o em dois assaltos também. O mundo do boxe estava impressionado com tal demonstração de força e poder.
Estes eram os dois concorrentes ao título. Ali contava com 31 anos na altura do combate previsto e Foreman com 25.

Passamos agora ao resto. Ambos os pugilistas conheciam a fama um do outro e sabiam qual era o estilo um do outro. Ali era conhecido pela sua forma de «dançar» no ringue, estando sempre em movimento e atacando quando podia. E era com isso que Foreman contava, e treinou no sentido de conseguir encurralar o adversário nos cantos do ringue ou nas cordas. Os jornalistas que testemunhavam os treinos de Foreman ficavam impressionados com a forma como ele conseguia fazer isso e poucos davam o favoritismo a Ali.
Pela memória de todos passavam as imagens das demolidoras vitórias sobre as únicas «bestas negras» de Ali e que Foreman tinha «destroçado» em somente dois assaltos. Todo o mundo jornalístico apontava a vitória para o campeão.
Ali, pelo seu lado, pensava o contrário, ele ainda era «O Maior», e iria provar a todos que estavam errados. Durante os treinos ele não mostrou grande coisa, deixando o seu companheiro de treinos bater nele enquanto ele estava nas cordas e soltando um ou outro soco. Isto causava incerteza na qualidade que Ali ainda teria para derrotar o seu oponente.

O Combate

No dia do combate o estádio em Kinchaza estava lotado. Todo o mundo estava em suspenso para saber o resultado da contenda. O primeiro assalto começa e Ali inicia a sua «dança» procurando fugir ao adversário e conseguindo acertar alguns socos. Mas logo aí observa-se uma inovação: como um verdadeiro estratega e profundo conhecedor do boxe Ali começou a efectuar os jabs com a mão direita e não com a esquerda. O jab é um soco em linha recta, com o braço paralelo ao solo e que não é muito potente, mas que pode ir desgastando o adversário. Também serve para poder abrir caminho para a «entrada» de um golpe mais forte que geralmente vem do braço mais forte, o direito.

Porém Ali tinha observado como Foreman bloqueava o jab de esquerda dos seus adversário com a sua luva direita mais avançada em relação ao corpo. Começando o combate com os golpes de direita surpreendeu Foreman e este levou com alguns socos na cara. Porém ao contrário do que Ali pensava, o seu adversário não se intimidou e passou a atacar como um touro em fúria. No final do assalto uma câmara foca a expressão de Ali e um comentador afirma que em todos os anos de boxe nunca tinha visto aquele olhar em Ali: era medo. Pela primeira vez na sua vida alguém não se tinha deixado intimidar pelo seu boxe e respondeu ainda com mais convicção. Muitas coisas devem ter passado pela cabeça de Ali, mas uma delas com certeza deve ter sido: «Este é o teu momento. Todos os especialistas estão contra ti, deixa de lado o medo e avança firme para aquilo que é o teu destino: ser campeão».

O certo é que a estratégia mudou, Ali deixou de efectuar a sua dança e passou a deixar Foreman atacar enquanto se encostava nas cordas e se protegia o melhor que podia. De vez em quando ia lançando fortes golpes que iam acertando na face do seu oponente. Durante 6 assaltos Foreman foi atacando, atacando, massacrando o corpo de Ali, mas sem conseguir acertar o golpe fatal na cabeça. A estratégia de Ali passava por conseguir absorver os golpes do adversário com a ajuda do balanço cordas e deste modo desgastar Foreman. E foi o que aconteceu.
Já bastante desgastado depois de vários assaltos em que atacou desenfreadamente a resistência e rapidez de reacção de Foreman já não eram as mesmas, e foi aí que Ali, durante o 8º assalto aproveitou a sua oportunidade e com dois golpes que «entraram» em Foreman levou o gigante ao tapete. O estádio «explodiu» de entusiasmo. Ali voltava ser o campeão do mundo, e contra todos os prognósticos! Ele era de facto «O Maior».
A Lição

O que é que podemos recolher daqui? Primeiro, a utilização do factor surpresa. Para poder derrotar Foreman, Ali variou os seus golpes no 1º assalto e surpreendeu o adversário. Isto faz-nos ver que não devemos ser robots na vida, comportando-nos sempre da mesma maneira programada perante as situações que nos ocorrem no quotidiano. Algumas situações exigem de nós uma maneira nova de abordar os problemas, novas perspectivas que poderão permitir as dificuldades.

Segundo, a superação do medo. Apesar de ter supreendido o adversário, o resultado não foi o esperado, pois este em vez de se amedrontar libertou a sua fúria. Nestas alturas a dúvida costuma entrar nas pessoas e isso leva ao medo de não se conseguir atingir o objectivo. Ali conseguiu manter o seu centro, controlou as emoções e puxou por toda a vontade que tinha dentro dele, para poder continuar.

Terceiro ponto, a improvisação. Se aquilo que estava planeado não tinha dado os resultados pretendidos então há que improvisar e arranjar uma solução. Ali passou a usar outra estratégia, devido aos treinos que tinha tido, em que deixava o seu companheiro socá-lo várias vezes e com força, Ali robusteceu o seu corpo em relação à dor e utilizou isso para poder desgastar, com a ajuda das cordas, o seu adversário. Por vezes na vida, temos que aprender a suportar vários golpes dolorosos, mas necessários para que no momento certo possamos ter acesso ao que pretendemos. Ali aguardou seis rounds, mas não de uma formam totalmente passiva, ele ia socando de vez em quando, da mesma forma que nós no quotidiano, mesmo perante a dor devemos ir realizando as nossas acções. Essas acções serão as sementes de algo que frutificará no futuro. Os socos de Ali foram deixando marcas em Foreman, a sua cara ia inchando aos poucos e os frutos da resistência à dor e dos seus actos frutificaram no 8º assalto com o KO de Foreman.


Conclusão

É assim que a partir de um combate de boxe se pode extrair algumas lições para a vida, pois afinal a própria vida é um combate, mas não carregado de violência, mas devido à oposição de forças. Uma uma planta para nascer tem que romper a semente e «lutar» contra a resistência da terra para poder chegar ao ar; um animal para sobreviver tem que combater contra as condições climatéricas adversas e os predadores que possa ter. É uma luta necessária que faz com que o melhore de cada pessoa possa surgir, se conseguir superar a angústia, o medo, a dúvida e o sofrimento.